A Chegada de Mefisto

Naquele dia, Mefisto pousou.

Milhares dele surgiram. Dourados, portando vestidos de sangue e coroas douradas.

Vinham do céu como grandes pedaços de neve.

A população da terra hipnotizada observava em catarse, enquanto eles desciam.

Todos aguardavam. Suas bocas secas, olhos dilatados, achando as dores de seus interiores.

E ninguém sabia se Mefisto estaria aqui amanhã.

Mas você não notou Mefisto, pois

Naquele dia, Mefisto chegou, e neste dia, o cemitério ganhou pulmões e respirou como se devorasse multidões. E os zumbis ganharam traquéias e dentes feitos de ossos, olhos de gárgula e fúria de titãs. O chão entrou em erupção, e os mortos vieram contra nós, e gritamos, e choramos, e corremos.

Mas você não notou isso, pois

No dia de Mefisto, no dia do cemitério pulmonar e da morte eminente, o Ragnarok ganhou vida, e a televisão mostrou o enorme navio que vinha em nossa direção.

Névoa e homens com barbas formosas gritavam á Hela, e uma serpente e lobo maiores do que nossa mente poderia conceber, avançavam contra os arranha céus da metrópole.

O diretor largou a câmera e começou a rezar, enquanto um gafanhoto gigante devorava sua jugular.

Mas você não os notou, pois

No dia de Mefisto, zumbis, Deuses, pragas e morte, os portões quebraram.

Corremos para as igrejas, mas o próprio Jesus nos renegou.

Não havia eternidade nem perdão.

Neste dia, em que o sol cedeu lugar ao limbo eterno, as plantas secaram, os plásticos dissolveram.

A internet não conectou, e as telas dos computadores diziam OBEDEÇA-NOS.

Neste dia, os anjos ficaram bêbedos, os bares foram dominados por Vikings ensaguentados, e os sinos tocavam sem parar. E o som do vazio aterrorizava nossas audições necrosadas.

As lendas morreram. As esperanças. Nós.

Você não notou o nosso fim, pois estava sentada em uma sala de estar, fazendo nada, nem lendo, vendo ou estudando. Você só estava olhando para o telefone, esperando a minha ligação.

O Enterro do Filho Nunca Amado

Um enterro com mil anos de lástima,

para um depressivo verme da terra,

ingrato, incrédulo e insolente.

Solidão, seu sobrenome ao relento.

 

Nem sua parideira lhe amou,

em morte, a terra rejeitou,

no vácuo se encontrou.

Defunto sem alma, cria sem vida.

 

As lepras são suas companheiras,

miserável humano das fezes, imundo ser

da fornalha social, nada foi e nada serás.

 

Descanse em desespero, filho nunca amado.

Androidiano

 

 

 

 

Andróide desde menino.

 Notebook, punheta e leite Ninho.

O sangue deixa de existir, eletromecânica vida,

biomecânico material, pulmão de aço,

falo industrializado.

 

Robô é trabalho forçado, o peão recebe o fardo,

a arte modernizou, Asimov é o novo Deus,

O Panteão de Fios e Neuroses convoca os ciborgues,

enquanto os loucos se entrelaçam no Chato.

 

O futurista torna-se atual, fundi-se

ao Mecanismo de Dispositivos

Pós-Modernistas de Atuação Corporal-Cerebral.

Essa é a última poesia mundial. Leia sem piscar.

Finja aproveitar.

 

A vida é na televisão, os quadros de Picasso estão na mente,

os livros são em braile, a comida via reto, enquanto o

mundo cede ao teclado, movendo toda

a cultura para a Vala dos Circuitos Usados.

 

 

ODE AO COLOSSO

A Revolução dos Fracos (O primeiro ataque do Colosso destruidor de crenças)

A HUMANIDADE foge dos vodus invocados pela criatura, somos macacos de mãos hábeis a gesticular, enquanto o inevitável vocifera em nossas audições. As veias esquentam, o sangue pútrido da criatura extingue o amor e o ódio, os sentimentos são vazios, a única esperança do globo é a fuga, correr em busca de refúgio. Pessoas lacrimejam como princesas, gemem com fartura.

Humanos vindouros do esterco. A criatura niilista resmunga.

A transformação ocorre, a morte toma conta do suor humano, a terra é o refúgio do fim. Sob todos os aspectos possíveis, eu vejo o Colosso. Fugaz, temeroso e imponente, feito de vísceras e rostos, toda a vida humana é o seu ser carnal.  A neurose atinge meu cérebro, Colosso me observa. Eu choro, não consigo manter a razão. O objeto Colosso, destruidor de crenças, inimigo nosso, dos Deuses e Diabos, é o universo, belo e horrendo. Ele lança as sementes de fetos sob o asfalto. Dentes em forma de arames farpados. Colosso some com o atual, destrói o convencional, nada somos a partir de então.

Pregações de virgens envelhecidas, credos e cruzes dementes, dançam sob o sol mistificado. Ave Maria vai pro saco.

Próximo a mim, vejo os rebeldes, aqueles que nunca desistem. Jorram palavras amaldiçoadas, arremessam objetos de vidro, pedras e lixos, alguns armados, atiram as balas mortíferas contra o herético bicho. O amorfo é instalado. Pensadores tentam conceber teses, elaborar motivos, o domínio dialético está fodido, o Colosso devora as suas entranhas e jorra as fezes do alimento ao léu, em cada pedaço de estrume, é visível o rosto de um gênio.

De Einstein a Hegel.

As lágrimas a descer, dirigem-se ao chão quente. A emoção de observar algo tão grandioso e aterrorizante me encanta. Garrafas, facas, bombas de fumaça, tudo é inútil. O Colosso é constante, sua fúria é hipnótica, seu ataque é de cascavel. O tremor é morte, a dor é sangue, o medo é insano. Fiquem parados, eu digo, a fuga é débil.

O incontável infinito do universo, constituído de anjos, humanos e demônios é o seu alvo de crítica. Não importa que criatura seja: Você é um pedaço de papel, perante a amplitude do Colosso. Ele paira a minha frente, megalomaníaco ser caótico de beleza e feiúra formidável. Os arames são visíveis. Sua boca feita de intestinos grossos emite o trovão sepulcral, meu corpo e o dele tornam-se um.

A escuridão fétida da morte adentra lentamente em meus músculos e ossos.

O meu mundo termina, enfim.

 

COLOSSO

O Inferno recheado de boas razões,

a Terra de intenção, o Paraíso de cifrão,

o verso maledictione é emitido, o grito

emergido, invoca o Colosso-Juíz ao infinito.

 

Aversão aos homens, deuses e demônios,

imortal do ego, Colosso das terras

amargas, salga a água e apodrece o alimento,

vulgariza o destino e fragmenta o sigilo.

 

Narciso arranca o rosto, teme o Colosso,

vil criatura da desforra, vomita leis para

o todo, acima de qualquer crença, palmas

para o magnificente, Deus atual da terra-fosso.

 

Simula Judas como ninguém, beija seus lábios

quentes, brota vermes em sua traquéia,

resistir é inábil, respire e deixo-o entrar,

Colosso eterno, rei da contra hipocrisia,

O Mundo, Céu e Inferno tornam-se seu lar.

 

Subjugue o coração, converta todos

em uma só massa, mostre que a diferença

está no lugar, no final das contas,

todos somos esgotos entupidos,

esperando o fim do próprio respirar.

Selado

 Seus segredos estão enterrados

em minha pele alva, aguardo

ser purificada do nosso pecado,

neste exílio amargurado.

 

Minha inocência é sangue, vazou

das minhas pernas longas, você

reza, chora, faz drama, foge com

a cruz e implora por perdão.

 

Deus amado há de lhe banir,

padre amaldiçoado, arrancou

meu selo sagrado, fugiu com

a lúxuria, largou-me com a fúria,

sem reza nem diabo.

os homens de terno e o Resto

 RESTOS de seres, eles escolhem prazeres por certo e errado, suas vidas são vísceras estiradas em uma engrenagem chiaroscura construída de louvor. A argamassa é o pagamento do dízimo. Os homens de terno contemplam essa boiada de restos e enquanto observam, eles urram entre vertigens imaginárias, conjuram termos guturais, dialetos de tempos perdidos e esquecidos por todos nós.

 

A terra, céu e inferno tornam-se um, os homens de terno atingem o nirvana, o poder máximo; expulsam a espécie viscosa de sangue negro do possuído moribundo.

O sangue transforma-se em chuva torrencial, amaldiçoa a todos do templo sagrado, “aproximai-vos infiéis, limpai-vos seus sangues entupidos de miasma.” Logo após o manifesto, os justos caem por terra: lágrimas flutuam em seus campos, enxurradas de loucos, legiões, diabos da macumba secretamente dançam em todos os templos mentais, a massa ajoelha perante os homens de terno.

 

Lembro, contudo, de um jovem em pé, um rapaz franzino, negro e careca, parado diante da aglomeração de intestinos cagados a sua frente. Os seus olhos estavam semicerrados, os lábios fechados e secos, a sua expressão era rígida. O jovem era o instrumento do medo, derivado dos gritos dos homens de terno, uma rocha inválida. Elevei-me ao olhar do jovem, adentrei-me em suas pupilas e fiz da retina meu lar. Observei a verdade crua, gélido como um iceberg tornou-me, entrementes, fisicamente abalado e mentalmente perturbado fiquei. Hoje, deitado em minha cama, sem mexer um músculo ou osso sequer, ainda vejo os restos dos seres, aqueles que determinam prazeres, entupidos por um miasma imaginário. Acima deles, os homens de terno, todos sendo expostos da forma como nasceram à casta, suas aparências reais e grotescas fizeram o sinistro adentrar em minha carne, sugaram o sangue até emergir em minha alma, para assim residir e nunca mais sair. Abençoai-vos sejam aqueles que vêem a verdade, meus irmãos.

Amen.

A Irmã de EROS (Lolita de Ray-Ban)

Dedico para as mulheres de esquina.

RESPIRA como se não habitasse o universo, sorri com certo abuso, indiferente aos ébrios de esquina. Rainha, mulher, santa, vadia. Uma erupção momentânea, cravada na cabeça rósea de todos os alfas, a atingir os ômegas, atingindo o prepúcio e o fim. Apocalipse 1:8 foi feito para ela. Deusa da ruína, segura de si, uma confusão abraçada em todas as formas e cheiros, imponente a todos que a cercam.

 

Descobri, enquanto observava os seus óculos Ray-ban antigos, que ela é a filha do Caos, irmã de Eros. Ela unifica os sexos em nome do seu corpo, explora os sentidos de qualquer coisa viva que a observa. Os seios pontudos, bicos enormes, a filha do nada e de tudo, habita o banco de trás do carro, ao meu lado. Seguimos pela Conselheiro Aguiar, iluminados pelas luzes da noite do Recife. Meu colega dirige, afirma que eu devo ir logo, ouso olhá-la, cabeça levantada, o sorriso que esnoba o cosmo, joelhos fechados, exibindo os pelos abundantes do seu sexo angular.

 

Ela olha para mim, o Ray-ban a me encarar, enquanto torno-me rígido.

 

“Vai. Ela custa caro.” O motorista diz.

 

A cavalgada estremece o meu pensamento, ela arranca o Ray-ban, cabelo preto e longo escorre em sua face, os olhos castanhos me atingem como vermes no intestino grosso, eles entram em meus neurônios e ascendem em minha glande. A irmã do caos, a dama que estremeceu a base divina, transfigurando o amor como uma alquimista, exibe um sorriso incógnito, criado por Loki, desenhado por Sade e finalizado por Anais Nin.

 

A perfeição fica por conta de Michelangelo.

 

Ela pede para colocar uma música, o ato do afogar o ganso é um reprocho, deve ser feito com som ambiente (não existem camisinhas, afinal, o ato de procriação foi extinto) o cd é introduzido, The Strokes toca Last Nite, a caída abre as pernas, exibe aquilo que destruiu Deuses, desconfigurou o nosso cotidiano e mudou os sentimentos do ser humano. Pelos escuros, uma mata rasgada, assim como a voz do Casablancas, gutural ao nível sexual, abrindo aos poucos, enquanto o solo é enfiado goela a baixo. Meu pensamento segue as Glândulas de Bartholin, secretando o muco lubrificante, enquanto meu sexo e o dela copulam em uníssono. Ela exibe a língua, um pequeno piercing, desço para os seios novamente, minha mão os fechava de tão pequenos eram, entretanto, tão firmes!

Orifício genital, canal vaginal, eu viajo sem freio, suando a bicas, ao som do Nine Inch Nails, eu a viro, o rabo branco ilumina a face do meu universo, o tecido epitelial exibe-se, enfio até o útero, as bolas entram com tudo, enquanto ergo a cintura dela. A música diz “You let me violate you, you let me desecrate you, you let me penetrate you, you let me complicate you…”

 

Ela geme. Som e carro paralisam. Desgaste temporal. A hora fica doente. Os compromissos deixam de existir. Cronos tomba. A boca dela aberta, os dentes brancos e simétricos sendo exibidos em câmera-lenta. Os segundos são faíscas, persigo o som da voz do amor, em meus ouvidos, a ninfa cantarola feitiços, enquanto jorro o suplício.

 

O suor torna-se um.

 

O hímen é o meu brinde, o planeta está de ponta cabeça. O Ray-ban retorna a seu rosto cândido. Eros concretizou o seu plano, construiu a irmã que habita no sonho de Deuses e homens, assumiu o seu posto de tirano. O motorista entrega o cd e pagamento a ela, enquanto os seus lábios encostam-se aos meus. A porta se abre, seu corpo desnudo é substituído pelo vestido florido e um tênis all star, o fone de ouvido em seu lugar, a mão a acenar adeus, a saudade amargando em meu peito. Até a próxima vez, eu digo, mesmo sabendo que ela não há de ocorrer. A Deusa nunca repete o seu alvo. Ela desaparece em meio a multidão que ela comanda e encanta.

 

A Deusa perfeita, a fortuna de toda uma vida que se esvai. A Puta feliz e rica.

O tempo ainda paralisado, eu espreito o seu último rebolado, desejando que este breve momento fique em minha mente para todo o sempre. Até o fim da minha vida na humanidade.